A “paternidade” do Pix é um assunto que gera discussões acaloradas nas redes. Apoiadores de Jair Bolsonaro (PL) afirmam que o ex-presidente seria o criador do método de pagamento e têm reiterado essa afirmação distorcida em notícias sobre o crescimento do sistema no Brasil e no mundo.
Em discurso no ato da avenida Paulista no domingo (6), o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), falou sobre a “felicidade do presidente Bolsonaro fazendo o Pix”.
As primeiras discussões sobre a criação do Pix remontam ao período entre 2014 e 2018, das gestões Dilma e Temer. Segundo o BC (Banco Central), no entanto, o sistema foi desenvolvido por técnicos, sem interferência de governos.
Para sanar dúvidas sobre a origem do Pix, Aos Fatos montou uma cronologia de eventos que levaram à criação desse sistema de pagamento, que hoje é usado por três a cada quatro brasileiros.
- 2014: Interesse por pagamentos em tempo real
- 2016: Estudo de modelos
- 2018: Criação do grupo de trabalho
- 2019: Formulação e desenvolvimento tecnológico
- 2020: Lançamento
2014: Interesse por pagamentos em tempo real
A primeira ocasião em que o BC (Banco Central) fez menção a características do Pix foi no Relatório de Vigilância do SPB (Sistema de Pagamentos Brasileiro) de 2013, publicado no ano seguinte.
Em meio às políticas citadas pela autarquia para promover a eficiência e a segurança do sistema de pagamentos do país, havia a menção à busca por soluções que permitissem “pagamentos de varejo em tempo real e ininterruptos, sendo desejável que os recebedores pudessem ter os valores pagos disponibilizados imediatamente em sua conta”.
Na época, o BC era presidido por Alexandre Tombini, indicado pela então presidente da República, Dilma Rousseff.
2016: Estudo de modelos
O Comitê de Pagamentos e Infraestrutura de Mercado do Banco de Compensações Internacionais, que reúne 55 instituições centrais ao redor do mundo, incluindo o BC, publicou em novembro de 2016 um estudo sobre possíveis modelos para sistemas de pagamentos instantâneos.
Um dos integrantes do estudo era o então chefe adjunto do Deban (Departamento de Operações Bancárias e de Pagamentos) do BC, Rogerio Antonio Lucca, que hoje ocupa o cargo de secretário-executivo na autarquia federal.
No mês seguinte, o BC promoveu um workshop em que compartilhou com a indústria brasileira a experiência de alguns países na implementação de soluções sobre pagamentos instantâneos.
Na época, a autarquia era presidida por Ilan Goldfajn, indicado pelo então presidente, Michel Temer (MDB).
2018: Criação do grupo de trabalho
Ao observar a dificuldade do mercado em implementar uma solução aberta de modelo instantâneo de pagamento, o BC decidiu assumir a liderança no desenvolvimento e da infraestrutura tecnológica do sistema.
Em maio de 2018, seis meses antes de Jair Bolsonaro ser eleito presidente da República, a autarquia instituiu um grupo de trabalho denominado Pagamentos Instantâneos, que envolveu cerca de 130 instituições.
O trabalho desse grupo resultou na formulação dos requisitos fundamentais, divulgados publicamente em dezembro daquele ano, para a implementação do que viria a ser o Pix. Na época, ficou estabelecido que o detalhamento do ecossistema de pagamentos seria realizado ao longo de 2019 e de 2020.
2019: Formulação e desenvolvimento tecnológico
Cerca de um mês após Roberto Campos Neto, indicado por Jair Bolsonaro, assumir a presidência do BC, a autarquia criou o fórum para assuntos relacionados a pagamentos instantâneos, conhecido na época como Fórum PI.
Meses depois, em agosto, foi publicado um comunicado com atualizações sobre os requisitos fundamentais para o ecossistema de pagamentos instantâneos brasileiro.
Entre as medidas estava a criação de uma base única e centralizada de dados, que armazenassem “chaves ou apelidos” para permitir que o pagante usasse informações que já possuísse sobre o recebedor, como número de telefone, F ou CNPJ e endereço de email, para realizar a transação.
No fim daquele ano, o Banco Central iniciou o desenvolvimento da infraestrutura tecnológica do ecossistema de pagamentos que viria a ser o Pix.
2020: Lançamento
No segundo ano da gestão de Jair Bolsonaro, o BC lançou a marca Pix, que foi descrita na época como uma “nova forma de realizar pagamentos e transferências no Brasil”.
Em junho, o BC criou o SPI (Sistema de Pagamentos Instantâneos), uma espécie de plataforma que interliga todas as instituições financeiras e de pagamento que participam do Pix.
Dois meses depois, foram publicados o regulamento do Pix (Resolução BCB nº 1/2020) e outros documentos complementares, que descrevem as regras de funcionamento e as diretrizes técnicas do sistema.
Em 5 de outubro de 2020, o BC iniciou o cadastramento das chaves Pix pelos usuários finais.
No mesmo dia, ao ser questionado sobre o sistema por um apoiador, o então presidente da República, Jair Bolsonaro, inicialmente acreditou que o termo se referia à aviação civil. Ao ser alertado que se tratava de um tema relacionado ao Banco Central, Bolsonaro disse desconhecer o sistema, que já havia mencionado em publicações em suas redes (veja aqui e aqui).
Bolsonaro não sabe o que é Pix pic.twitter.com/rJv1S1A00Y
— Sam Pancher (@SamPancher) October 5, 2020
Pouco mais de um mês depois, em 16 de novembro de 2020, o Pix foi oficialmente lançado.
Evolução constante. Desde então, o sistema ou por uma série de aprimoramentos de segurança, como o MED (Mecanismo Especial de Devolução) — ferramenta que permite estornar transações em caso de fraudes e golpes.
Também foram criadas novas modalidades de transação, como o Pix por aproximação, lançado em fevereiro deste ano.
O caminho da apuração
Aos Fatos consultou documentos do Banco Central e do Banco de Compensações Internacionais e contextualizou com informações divulgadas pela imprensa. Acrescentamos também no texto o posicionamento do BC sobre o tema.