As peças enganosas somavam centenas de visualizações no TikTok até a tarde desta quinta-feira (5).

Você não vai acreditar no que o TSE acabou de fazer. Depois de três anos da eleição, agora resolveram recontar os votos. É isso mesmo que você ouviu. O Tribunal Superior Eleitoral está recalculando os votos de 2022 e pode tirar sete deputados federais dos cargos. E adivinha quem mais perde com isso? O PL. A direita. O povo que elegeu nas urnas. Estão mudando as regras do jogo com a partida já terminada. Dizem que foi por causa de uma decisão do STF, mas como confiar num sistema que só reconta o que interessa? Se a eleição foi segura, limpa e sem erros, por que só agora mexer nos resultados? E mais, se vão retotalizar os votos de deputado, quando vão fazer o mesmo com a eleição presidencial? Isso não é justiça, isso é manipulação.

Frame de vídeo compartilhado nas redes mostra foto da ministra do STF e presidente do TSE, Cármen Lúcia — mulher branca de cabelos grisalhos —, que aparece usando uma toga preta e sentada em uma cadeira com o estofamento na cor vermelha. Legenda sobreposta ao vídeo diz: ‘Urgente: TSE manda recontar os votos de 2022’.

Publicações enganam ao fazer crer que o TSE irá recontar os votos das eleições de 2022 por conta de falhas de segurança ou para prejudicar partidos de direita. A corte determinou a retotalização dos votos para deputado federal por conta de mudanças em um processo conhecido como “sobra das sobras eleitorais” — nome dado às vagas remanescentes após a aplicação do cálculo dos quocientes eleitoral e partidário.

Esse processo é a última etapa do sistema proporcional de votação, adotado no país em eleições para câmaras municipais, assembleias legislativas e Câmara dos Deputados (veja abaixo como funciona). Isso significa que a medida não está sendo tomada por supostos erros ou falhas na apuração dos votos.

Em fevereiro de 2024, o STF julgou três Ações Diretas de Inconstitucionalidade (7228, 7263 e 7325) em que o PP, o Podemos, o PSB e a Rede questionavam os critérios de distribuição da “sobra das sobras eleitorais”, que foram alterados em 2021 pela lei 14.211, sancionada por Bolsonaro.

Segundo as regras, podiam concorrer à distribuição das "sobra das sobras" apenas os partidos que conquistassem votos equivalentes a pelo menos 80% do quociente eleitoral. O PP, o PSB, o Podemos e a Rede alegaram que a exigência gerava distorções e privilegiava as maiores siglas.

Por sete votos a quatro, os ministros do STF entenderam que:

Além disso, por seis votos a cinco, o STF decidiu também que as mudanças valeriam a partir das eleições de 2024, e não afetariam o resultado das eleições de 2022.

Os partidos, no entanto, recorreram, questionando o período de validade das mudanças. O argumento foi acatado pela maioria da corte em fevereiro deste ano, o que culminou no pedido de retotalização dos votos para deputado federal em 2022. Na prática, será feita a substituição de sete parlamentares, sendo dois deles do PL.

Como funciona o sistema proporcional?

Para determinar quais candidatos serão eleitos no sistema proporcional há diversas fases, com regras e fórmulas específicas. Aos Fatos explica abaixo como esse sistema funciona.

Primeira fase. Inicialmente, são calculados o quociente eleitoral — divisão do total de votos válidos pelo número de vagas em disputa — e o quociente partidário — divisão do número de votos válidos do partido pelo quociente eleitoral.

O quociente partidário define quantas vagas o partido terá direito nessa fase. As vagas de cada partido são preenchidas pelos candidatos que receberam mais votos.

Em 2021, foi incluída uma regra adicional: apenas ficam com a vaga nessa fase os candidatos que tenham recebido votos equivalentes a 10% do quociente eleitoral.

Digamos que uma determinada eleição tivesse 5 milhões de votos válidos, destinados a eleger 50 vereadores. O quociente eleitoral seria obtido ao dividir 5 milhões por 50, o que resulta em 100 mil. Assim, o primeiro requisito que o candidato precisaria cumprir para se eleger seria ter votos equivalentes a pelo menos 10% do quociente eleitoral — ou seja, 10 mil votos.

Caso um partido recebesse 1 milhão de votos e o quociente eleitoral fosse de 100 mil, o partido teria direito a dez vagas — esse é o quociente partidário. Assim, um candidato de um partido que tivesse 1 milhão de votos precisaria ter pelo menos 10 mil votos e estar entre os dez candidatos mais votados do seu partido para se eleger.

Segunda fase. Como nem sempre todas as vagas em disputa são preenchidas pelos cálculos feitos na primeira fase, há uma segunda fase, que distribui as vagas remanescentes.

Nela, participam apenas os partidos que alcançaram pelo menos 80% do quociente eleitoral, desde que tenham candidatos com votação mínima de 20% do quociente eleitoral.

Terceira fase. Caso as vagas ainda não tenham sido preenchidas, há uma terceira fase, conhecida como “sobra das sobras”. Antes da recente decisão do STF, participavam os partidos com pelo menos 80% do quociente eleitoral, sem a exigência de percentual mínimo de votação dos candidatos.

Com a recente decisão da Corte, todos os partidos políticos podem participar dessa terceira fase, independentemente do percentual obtido a partir do quociente eleitoral.

O caminho da apuração

Aos Fatos analisou as mudanças promovidas na lei eleitoral em 2021, os julgamentos das ações movidas pelos partidos políticos no STF em 2024 e as decisões da corte do ano ado e deste ano. Contextualizamos também com os respectivos desdobramentos da decisão do STF, que resultará na substituição de parlamentares.

Referências

  1. Congresso em Foco (1 e 2)
  2. Justiça Eleitoral
  3. STF (1, 2, 3, 4, 5, 6 e 7)
  4. Senado Federal
  5. Folha de S.Paulo
Boataria políticaChecagem
STFTSE

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